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Último mestre do Boi-bumbá da Paraíba

Produtores culturais de Taperoá, na região do Cariri, promovem uma campanha para o Mestre Antônio do Boi de Carnaval

por publicado: 18/01/2023 12h35 última modificação: 18/01/2023 12h35
Exibir carrossel de imagens Fotos: Acervo Pessoal Mestre dentro da Igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição, na década de 2000

Mestre dentro da Igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição, na década de 2000

por Guilherme Cabral*

 

Reformar a estrutura física do boi e costurar um novo estandarte. Esses são os objetivos da campanha #ValorizaOMestre, que um grupo de benfeitores e produtores culturais do município de Taperoá, localizado na região do Cariri do estado, vem realizando no intuito de que o Antônio do Boi de Carnaval, considerado o último Mestre do Boi-Bumbá da Paraíba, continue apresentando ao público essa manifestação cultural, que há 65 anos é uma tradição na cidade.

“A campanha vem ganhando força, já chegando ao patamar das metas de vendas das 50 camisas. Além disso, a iniciativa vem recebendo apoio dos empresários locais de Taperoá e de representações culturais de toda Paraíba”, informou a produtora e pesquisadora de cultura popular Érika Catarina. “O nosso objetivo, através dessa iniciativa, é promover o reconhecimento e a divulgação dessa tradição carnavalesca do Bumba Meu Boi que é levantada pelo Mestre Seu Antônio. Presente e resistente às adversidades, o Boi de Carnaval, como também é conhecido, é referência para a cultura e a arte da cidade de Taperoá, que tem como seus mais ilustres filhos o escritor Ariano Suassuna, Abdias do Acordeon, Vital Farias e Fuba, entre outros”.

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Há 65 anos, o folguedo é uma tradição na cidade pelas mãos de Antônio de Sousa Salviano, cuja campanha fará com que o brincante continue apresentando ao público a sua manifestação folclórica

Quem quiser contribuir pode comprar a camisa, cujo valor é R$ 35, mas há, também, a promoção “Pais e Filhos”, pois, se adquirir uma camisa adulta, a infantil sai por R$ 30, sendo variadas as formas de pagamento, via Pix ou cartão de crédito. Os interessados podem ligar para os responsáveis pelas vendas, que são os produtores culturais Érika Catarina Alves e Jordann Pimenta e cujos contatos são (83) 99663-7884 e 99863-8845, respectivamente. A comercialização e entrega das camisas também acontece em João Pessoa e Campina Grande, bem como há modos de cooperar diretamente com o Mestre em contas correntes e jurídicas. A intenção dos organizadores é que a primeira saída do Bumba Meu Boi ocorra no próximo dia 4 de fevereiro, durante a feira local, com previsão de muita adesão popular.

“Antônio de Sousa Salviano, que é o nome completo do Mestre, é um negro que mora com a esposa no Acampamento José Moreira, área de periferia, na Zona Rural da cidade. Ele tem 81 anos de idade, é lúcido e é o único dos mestres do Boi de Carnaval com vida. No início do século 20 existiam cinco desses bois em Taperoá e, hoje, ele é o último. Com essa campanha, estamos ajudando com mais afinco e queremos que o Mestre Antônio também tenha visibilidade para o resto da Paraíba”, disse Érika Catarina.

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Celebração do dia 7 de setembro, no início dosanos 1990

Há outro motivo que leva a pesquisadora a estar envolvida no projeto. “Meu pai tinha um comércio em Taperoá e contribuía com o Mestre Antônio, afixando com um alfinete quantia de dinheiro na bandeira que ele usava nas apresentações. É uma memória afetiva. O Bumba Meu Boi ali parece até que saiu de um folheto de cordel e é amado pela população. Em celebração por toda essa história, um grupo de benfeitores e produtores culturais lançaram a campanha #ValorizaOMestre, com o objetivo de reformar a estrutura física do boi, costurar um novo estandarte e doar o excedente dos lucros das vendas das camisas oficiais ao próprio Mestre da manifestação”, disse Érika Catarina, acrescentando que a intenção também é, quando for possível, inscrever projeto do Mestre em editais de incentivo à cultura, como as leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo.

Não deixar tombar
Apesar da idade avançada, o Mestre Antônio ainda guarda lembrança de como começou a apresentar o Boi de Carnaval em Taperoá. “Foi em 1958, quando estava com 18 anos de idade. Eu trabalhava com um cidadão, Raul Gouveia. Aí ele adoeceu e mandou me chamar. Ele disse: Tonho, eu mandei lhe chamar aqui porque estou doente e não posso brincar o boi e, se eu morrer, você segura a minha cadeira. Eu disse que então estava certo. Aí comecei a segurar e estou até hoje”, disse.

Seu Antônio comentou que costuma utilizar sete componentes para fazer a brincadeira. “Quando minhas condições estão permitindo, tem a minha sanfona, que está desmantelada, o tocador de triângulo e o da zabumba, além de dois para pegar o boi e outros dois para olhar o boi, porque tem que botar gente para guarnecer o boi. Eles querem bagunçar a brincadeira, mas comigo ninguém bagunça. Vou mandar ajeitar a sanfona, porque essa brincadeira só presta com acompanhamento”, afirmou.

O brincante comentou que, preferencialmente, sai com o boi oito dias antes do Carnaval e no sábado da folia. “Eu me apresento nas ruas, nas casas dos colegas. Quem tem prata me dá e quem não tem é a mesma coisa, porque o cabra não vai forçar ninguém a dar sem ter. Mas eu não deixo de ir à porta de uma pessoa. Me dê prata, ou não dê, eu vou. Do jeito que é um é tudo”, disse ele, acrescentando que costuma sair com o boi às 9h e ficar na cidade até as 14h. Durante o isolamento social, não realizou a manifestação cultural.

Seu Antônio chegou a conhecer vários mestres, que tinham diversas profissões, a exemplo de pedreiro e tocador de violão. “Um Mestre foi parando e o outro começando, até Raul, que me pediu para não deixar cair a brincadeira. Meus netos não são chegados, mas vou passar meu legado para meu bisneto”, perseverou ele.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de18 de janeiro de 2023.

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